O amor não é feito de dois adolescentes aos beijos e abraços frenéticos. O amor é feito de dois velhos, um homem e uma mulher encarquilhados de vida, provavelmente de olhar ausente, sentados num banco de um jardim...
«Não sei, amor, se dado nos será
de envelhecer. Será que um de nós só morrerá
quando formos tão velhos que para o outro
não faz diferença nenhuma que aquele morra
(na velhice se vive de memória vaga)?
Será que tantos anos de amargura,
suspeitas, frustrações, raivas e ódios,
tudo isso, tempestade, de que é feito o amor
que os burros não entendem, nos serão
acrescentados desse sonhar juntos
em silêncio, num sorriso (que se esquece
e mesmo nos lábios se ignora)?
Uma velhice que foi vida e será vida
porque foi vida com que nos comemos
quotidianamente um ao outro,
vorazes como peixes num aquário
de vidro inamovível, tão opaco,
translúcido, às vezes, transparente sempre,
que é o amor?»
11 de junho de 1971
Jorge de Sena, «Nocturno de Londres», Poesia III, Círculo de Poesia, Moraes Editores, pp. 198 e 199
![]() |
| Gustav Klimt, The Tree of Life, 1909 |

Sem comentários:
Enviar um comentário