domingo, 10 de novembro de 2013

Ondjaki

Ondjaki ganhou  o prémio José Saramago há uns dias. Isto não me entusiasmou, ou só me entusiasmou na medida em que é sempre bom saber que alguém ganhou um prémio. Não por ser o Ondjaki. Da sua escrita, só conhecia alguns excertos de contos, que fui encontrando nos manuais de Português do 3º ciclo. Nunca me impressionaram. Mesmo assim, no ano passado, comprei o livrinho Os da Minha Rua. Guardei-o. Nunca cheguei a ler. Entretanto, não porque o autor ganhou um prémio, mas porque uma explicanda minha me pediu que eu lhe sugerisse contos para uma apresentação oral, tirei-o da estante. Mais de um ano depois de o ter adquirido, precisei dele e levei-o para ser emprestado. Enquanto esperava pela moça necessitada de um conto, folheei o meu livrinho de histórias de Ondjaki e deparei-me com um excerto de que gostei muito. É o início de uma das duas cartas com que o livro termina. Trata-se da transcrição de dois exemplares de uma troca de correspondência entre Ondjaki e uma Ana Paula.  


«querida ana paula

         não sei exatamente onde estás, isto pensando que as frases que te queria entregar implicariam saber a tua localização geográfica, para depois equacionar a minha, mas logo entendi que não, que eu podia dizer estas coisas de outro modo, assim
         :
         escrevo-te de um certo sul
         ,
         porque às vezes dentro de nós faz sul
 
        e acabo de fechar um livro com aquela sensação esquisita (humana? metafísica?) que concluir um livro traz - como se a pele se imbuísse de certo fechamento, os olhos pedissem calma à luz e os sons ficassem terrivelmente delicados de se dizer e de se ouvir
         talvez esta carta seja o que eu não soube pedir aos outros, alguns dias de silêncio (...)»


Realmente, é um rapazinho virtuoso este Ondjaki... E não cheguei a esta conclusão por ele ter ganho um prémio. Este excerto é o meu fundamento. Claro que terei de ler outros para ter a certeza certezinha de que temos um escritor com o valor da intemporalidade que se exige a quem ganha prémios, mas confesso que, por enquanto, terei de ficar por aqui.

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